quarta-feira, 8 de agosto de 2012

Brasil aprova ações militares na Síria


Na última sexta feira, dia 3 de agosto, a ONU aprovou uma resolução que, descaradamente , permite ações militares contra a Síria, já alvo de intervenção estrangeira via mercenários pagos declaradamente pela Arábia Saudita e o Qatar, com o apoio oficial dos EUA, pela voz de Hillary Clinton. Barack Obomba também autorizou a CIA a interferir abertamente para a derrubada do governo de Baschar Al Assad. A resolução aprovada é uma pá de cal a todo esforço para uma resolução negociada e pacífica do conflito sírio. Detalhe grave: o Brasil votou a favor desta resolução que dá espasmos de prazer à indústria bélica.

O curioso é que há poucos dias, ante a pressões imperiais de Cameron, em Londres, a Presidenta Dilma , mantendo uma linha em política externa definida no Governo Lula, respondeu que o Brasil não vai apoiar intervenção militar externa contra a Síria e o Irã. De quebra, ainda acrescentou que o Brasil defende a soberania da Argentina sobre as Ilhas Malvinas, assim mesmo, falou Malvinas, não Falklands.

Contradições

Como explicar então esta distância entre as palavras da presidenta e os votos do Brasil na ONU, lembrando que esta é a segunda vez que o governo Dilma vota contra a Síria? Sem contar que houve a participação oficial do Itaramaty em diversas reuniões do chamado “Grupo de Amigos da Síria”, fóruns construídos inegavelmente para pressionar a ONU a tomar medidas contra aquele país, e, em cujas reuniões, representantes de governos estrangeiros, como a pavorosa Clinton, defendeu publicamente o abastecimento de armamentos aos chamados rebeldes.

Aliás, este distanciamento da política externa atual em relação aquela aplicada no governo Lula, tem se revelado cada vez mais acentuado, especialmente quando se trata de situações em que os interesses norte-americanos são contrariados por países que sempre representaram uma política e uma atitude de soberania, autodeterminação e independência frente às pressões da Casa Branca.

As contradições são visíveis, inegáveis: Dilma joga na cara do Cameron que o Brasil não apóia intervenção militar contra Síria e Irã, sustenta com firmeza e soberania o ingresso da Venezuela no Mercosul enfrentando a irritação da direita - para quem o Paraguai virou agora modelo de democracia - deixando-a falando sozinha, com seus porta-vozes midiáticos beirando o ridículo.

Em hipótese

No mês de julho, uma declaração do Chanceler Patriota, causou fortíssima interrogação. Ele disse, em entrevista reproduzida pela Folha de São Paulo, que o problema da Síria é que o país possui armas químicas de destruição em massa, aquele mantra da indústria bélica, que George Bush e os fascistas Collin Powell e Condolezza Rice decoraram e ecoaram mundo a fora pelo “jornalismo de guerra” que levou de roldão a BBC, até que uma chuva de bombas começou a cair sobre Bagdá. Até hoje não sabemos quantos morreram, mas sim que há uma montanha de cadáveres como resultado da aplicação deste mantra macabro.

O chanceler Patriota, no dia seguinte a esta declaração, voltou a público para “explicar” que quando falara de armas químicas de destruição massa nas mãos da Síria” estava falando apenas , atenção,“em hipótese” Compare- se a gravidade da declaração, com a candura da explicação dada no dia seguinte.....

Antecedentes perigosos

Em 2002, o chanceler do governo FHC era Celso Lafer. Uma briga de gigantes se desenvolveu nos bastidores a partir do momento em que o mantra das armas químicas começou a ser entoado na Casa Branca. Após uma reunião a portas fechadas com Collin Powel, Celso Lafer começa a atuar para que o Embaixador Maurício Bustani, Diretor-Geral da OPAQ - Organização para a Proibição de Armas Químicas, fosse afastado do cargo. Bustani, brasileiro de valor, honrando as melhores tradições brasileiras de não vassalagem aos poderes da indústria bélica que, por sua vez, dão as cartas na diplomacia de guerra, havia entendido o significado daquele mantra macabro. A ele resistia com honradez.

O quadro geral, como sabemos, era e é ainda hoje, de que os países mais armados querem impedir que outros se armem. Especialmente se estes outros países são independentes e possuem potencial de desenvolvimento econômico e tecnológico. A pressão surda contra o programa nuclear brasileira também se encaixa nesta linha de raciocínio. Frente tudo isto, Bustani, no estrito cumprimento de suas funções como Diretor-Geral da OPAQ, para a qual havia sido eleito pela maioria dos países membros, começa a pagar o preço amargo por sua indisposição com a função de vassalo de impérios. Para dar uma idéia da importância e da relevância das funções desempenhadas pelo embaixador Maurício Bustani, vale citar que todos os esforços reais pelo desarmamento confrontam o lucrativo capital das armas, especialmente onde ele é mais pujante, nos EUA

Mantra macabro

Os EUA sabiam que a OPAQ estava prestes a realizar uma comprovação técnica internacional no Iraque, que demonstraria não ser aquele país possuidor de armas químicas de destruição em massa, mantra que Lafer levou a sério, após aquela reunião a portas fechadas com Collin Powell, em Washingon. Para surpresa dos países membros da OPAQ o Brasil retira apoio ao Embaixador Bustani quando os EUA, oficialmente, faz pedido oficial para o seu afastamento, argumentando qualquer coisa, qualquer pretexto, algo como “ele é muito exaltado e não toca bem piano”, o que, para quem o conhece, não é verdade.

Ante a imposição dos EUA para o afastamento de Bustani, os países membros esperaram pela sustentação brasileira do seu nome, o que não ocorreu. Como se lembram, Celso Lafer foi aquele chanceler brasileiro que, revelando infinita vocação para a vassalagem, retirou os sapatos, em várias oportunidades, sob ordens de guardinhas de alfândega nos aeroportos dos EUA. Tais exigências fazem parte do script traçado a partir de 11 de setembro de 2001 para “a declaração de guerra ao terrorismo”, como magistralmente denunciou o genial escritor Gore Vidal, que acaba de nos privar de sua inteligência. Mas, não de sua obra.

Comparar é preciso

Nesta mesma época, o Senador Roberto Requião, chefiando uma delegação oficial do Senado Federal aos EUA, também foi barrado por um guardinha de alfândega que queria ver toda a delegação sem sapatos. Requião fez o que um chanceler deveria ter feito: botou o dedo na cara do guardinha e declarou alto e bom som: “Esta é uma delegação oficial do Senado do Brasil. Não vamos nos submeter a nenhuma revista vexatória nem tirar os sapatos . Deixem-nos passar, em caso contrário a visita oficial está encerrada aqui mesmo!” 

De um chanceler não se espera menos. Evidentemente, desde que ele esteja realmente imbuído dos interesses nacionais que deve representar. Houve telefonemas, telefonemas, consultas e, minutos depois, o guardinha, talvez o mesmo que tenha revistado o chanceler, voltou e liberou a passagem da delegação de senadores. Todos com sapatos. Mantida ali, a dignidade nacional.

Relações perigosas

Independente das funções desempenhadas pelo chanceler Patriota lá em 2002, o que é possível captar agora é uma certa linha de convergência entre a sua declaração recente e aqueles esforços feitos pelo chanceler Lafer, lá no governo FHC, para o afastamento do Embaixador Bustani do cargo de Diretor Geral da OPAQ. Como pano de fundo, sempre o mesmo o mantra das armas de destruição em massa que, em hipótese, o chanceler Patriota declarou existirem nas mãos do governo Sírio hoje. 

Afora a irresponsabilidade de declarações tão graves e desastradas quando estão em jogo os destinos de um povo e de um país com o qual o Brasil mantém relações normais de cooperação e amizade, ressalte-se que a declaração recente de Patriota parece um eco do mesmo mantra de mais de 10 ano atrás. Mantra que levou a diplomacia, então tucana, a uma espécie de adesão obediente e cooperativa - retirada de obstáculos - para que a guerra contra o Iraque se consumasse. 

A narrativa sobre esta página feia da diplomacia brasileira está magistralmente registrada no livro do professor Moniz Bandeira, “As relações perigosas: Brasil-Estados Unidos”, que recomendo com força. Quando hoje está mundialmente comprovado a inexistência daquelas tais armas de destruição em massa nas mãos do Iraque, a diplomacia brasileira, tem, no mínimo, explicações a dar, tendo em vista ser direito de todas as instituições e de cada cidadão brasileiro, exibir transparência e coerência democráticas de nossa política externa.

Mudança de posições

Apesar dos esforços da Russia, China, Africa do Sul e Índia por uma solução pacífica do conflito sírio, o Brasil, uma vez mais, votou distanciando-se dos Brics e em sintonia do esforço imperial por impor uma nova, mais uma,. intervenção militar estrangeira. Após a intervenção militar da Otan na Líbia, arrancada a fórceps da ONU, muitos países têm reformado sua posição no cenário mundial, pois, vai ficando clara uma disposição norte-americana para um enfrentamento bélico. 

Dois exemplos recentes: os EUA estão a ignorar todos os acordos anteriores feitos com a Rússia e continuam tomando medidas para instalar um escudo anti-míssil na Polônia, o que levou o Chefe do Estado Maior Russo, General Makarov, a afirmar, na semana passada, que as forças militares de seu país podem optar pura e simplesmente por destruir estas instalações, caso os EUA não respeitem os acordos.

O outro exemplo, é a nova estratégia de ocupação dos mares asiáticos pela Marinha dos EUA, levando a Austrália, onde estão instaladas bases militares estadunidenses a ser apenas mais uma marionete do Pentágono na região, onde o alvo, obviamente, não é o pequenino Timor Leste, mas a China. A reação da China tem registrado um tom incomum para a conhecida paciência oriental. Hu Jin Tao, dirigente chinês, diante da ocorrência de inúmeras manobras militares conjuntas sino-russas convocou os dois exércitos a união “porque o imperialismo só entende a linguagem da guerra”. 

Além disso, os dois países, diferente do que ocorreu quando da invasão da Otan à Líbia, oportunidade em que os dois gigantes lavaram as mãos com sangue do povo líbio, agora, diante do novo script da agressão gradual do império no capítulo Síria, despertaram. Já se posicionaram de modo irredutível contra qualquer intervenção militar externa contra o governo de Damasco. Tal mudança de posição é acompanhada pela nova posição iraniana que, diferente do que fez diante da crise líbia, agora tem sido enérgica em defesa da autodeterminação síria.

Precedentes

Será que o importante giro em política externa de países centrais dos Brics, como a Rússia e a China, e agora também na política do Irã, não deveria representar vigoroso motivo de rediscussão da posição brasileira na ONU que, praticamente, endossou a Resolução que celebra o terrorismo praticado por mercenários na Síria, com o apoio da Otan? Os direitos humanos não foram elencados como parâmetro de definição da política externa brasileira? O que dizer do que se faz na Síria, quando a missão Kofi Annan por uma solução pacífica foi detonada exatamente pelos países que querem uma intervenção militar e apóiam militarmente os mercenários internacionais que lá atuam? 

E quando estes mesmo países da Otan, depois de lavarem em sangue sírio sua estratégia de ocupação territorial da Síria, na hipótese de derrocada do governo atual, se voltarem para o Irã com o mantra renovado entoando que a nação persa não tem direito de ter programa nuclear, apenas os que já têm? Qual será a posição brasileira? Pior ainda: e quando, num novo cenário mundial, estes países imperiais voltarem suas exigência contra o Brasil, que também pode vir a ser acusado , como o Irã, de ter programa nuclear? Ou de ser inepto em matéria ambiental, com o que se justificaria o apoio a comandos mercenários neste imenso território brasileiro, com vistas a esquartejá-lo? Qual será então a política do Itamaraty?Qualquer que seja, será tarde demais.....

Fraude midiática

Há inúmeras comprovações de que muitos dos supostos ataques dos chamados rebeldes sírios são gravados no Qatar e difundidos, entre outros, pela TV Al-Jazeera, perigosamente defendida aqui no Brasil como TV pública exemplar por certas vozes do movimento da democratização da comunicação , quando na realidade é um instrumento de falsificação informativa para justificar e pressionar a tomada de posições na ONU contra a Síria. Até mesmo a BBC foi colhida re-exibindo vídeos ou estampando fotos em seu site de situações ocorridas no Iraque anos atrás e agora apresentadas, fraudulentamente, como se fossem episódios do conflito atual da Síria.

Há uma simbiose entre esses meios informativos e a agenda de encomendas da indústria bélica, um dos poucos ramos econômicos a não ter sofrido duramente com a crise capitalista nos EUA. Os redatores e editores destas emissoras são conhecidos instrutores militares, e a CNN, já conhecida com Cia News Network, vai desenrolando o roteiro de intervenções midiáticas - a TV Síria, não apenas foi bombardeada com seu sinal foi desconectado dos satélites internacionais - que pavimentam a chegada das tropas da Otan.

Mensagem da Líbia

Será que nada disso fará o Brasil repensar sua posição na ONU, mesmo observando que está distanciando-se, nesta questão política crucial, da posição dos países dos Brics, e, também, da posição dos países que querem construir uma integração soberana na América Latina? Rússia , China e Irã entenderam , finalmente, a dura mensagem que a Otan enviou ao mundo ao invadir a Líbia. E o Brasil? Será tão difícil ver que há perigosas similaridades entre a ocupação estratégia do Mar da China pela marinha dos EUA e a reativação da Quarta Frota para o Atlântico Sul, particularmente após a descoberta do petróleo pré-sal?

A presidenta acertou quando disse na cara do Cameron que o Brasil não apoiaria uma intervenção militar na Síria ou no Irã. Mas, o apoio do Brasil a esta Resolução da ONU, que autoriza ações militares contra a Síria, levanta enigmáticas e misteriosas contradições. E isto não é apenas em hipótese.


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